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Autismo e inclusão escolar: desafios, conquistas e caminhos para transformar a Educação

04/09/2025
Crianças correndo na escola

Garantir o direito à Educação é assegurar que toda criança e adolescente, inclusive aqueles com Transtorno do Espectro Autista (TEA), tenham condições reais de aprender, conviver e se desenvolver plenamente. No entanto, para milhares de crianças e adolescentes no Brasil, a escola ainda não é um espaço de inclusão efetiva.

A Fundação Abrinq lembra que a inclusão não é um favor, é um direito. E cada passo em direção a ela transforma não apenas a vida de estudantes autistas, mas de toda a comunidade escolar.

Entendendo o espectro e os primeiros sinais

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento que impacta a comunicação, a interação social e o comportamento. Mas não existe uma forma única de ser autista: cada pessoa tem suas próprias singularidades, habilidades e desafios.

Na infância, os sinais mais comuns são atraso na fala, dificuldade de interação ou comportamentos repetitivos. “Quando o professor percebe que uma criança pode ter sinais de autismo, esse olhar aparece, primeiro, no relatório de desenvolvimento. Muitas vezes, a família não percebe esses sinais; quem nota somos nós, professores, porque convivemos com várias crianças e conseguimos identificar as diferenças entre elas”, explica Mariana Farias do Nascimento Vicente, professora de ensino infantil especializada em Psicopedagogia Institucional e Clínica.

Já na adolescência, identificar o autismo pode ser mais complexo. Muitas vezes, características como isolamento, crises de ansiedade, hipersensibilidade a estímulos ou dificuldades de socialização são confundidas com timidez ou “fases típicas” da idade que resulta em diagnósticos tardios, sofrimento emocional e sensação de inadequação.

Para esses adolescentes, o desafio dentro da escola é ainda maior. A pressão social, o medo do julgamento e a falta de compreensão por parte de colegas e professores podem intensificar o sentimento de exclusão. No entanto, quando a escola oferece apoio e cria um espaço de acolhimento, a experiência escolar pode se transformar em um ponto de virada, fortalecendo vínculos e ampliando horizontes.

Professora fazendo atividades com alunos em sala de aula

Inclusão escolar: do papel à prática

O Brasil possui uma das legislações mais avançadas do mundo em relação à educação inclusiva. Na prática, porém, ainda existem barreiras. Escolas com pouca formação docente, ausência de mediadores, falta de estrutura e uma cultura escolar baseada na padronização dificultam a construção de um ambiente realmente inclusivo.

Segundo Mariana, o maior desafio é romper com a ideia de que o aluno autista precisa se moldar ao sistema. “É o sistema que deve se adaptar às diferentes formas de aprender”, afirma. Esse esforço passa pela formação de professores, pela mediação pedagógica, pela flexibilização curricular e, sobretudo, pelo envolvimento ativo das famílias.

Para Luiza Almeida, o processo de inclusão escolar de seu filho foi marcado por aprendizados e desafios. “No início, me senti solitária e preocupada, pois percebi que muitos professores não estavam preparados. Mas hoje vejo meu filho acolhido, embora ainda falte atenção em relação a estímulos.”

O diagnóstico precoce, recebido aos 2 anos e 5 meses, foi um divisor de águas. “Isso me trouxe mais segurança. Quem cuida também precisa ser cuidado, por isso criei uma rotina previsível que ajuda meu filho a se regular e me dá tempo para cuidar de mim”, relata. Luiza reforça ainda a importância da rede de apoio e do acompanhamento especializado. Ela também destaca que, quando o acesso a terapias não é viável, é essencial buscar alternativas e fortalecer o apoio familiar comunitário: “Vocês não estão sozinhos. Não desistam dos seus filhos, busquem caminhos dentro da sua realidade e corram atrás do que é direito. Autismo não é sentença, é uma jornada.”

Caminhos para transformar a escola: o papel da gestão pedagógica

Se a inclusão é uma responsabilidade coletiva, a gestão pedagógica exerce um papel central nesse processo. Cabe a ela articular ações entre professores, equipe técnica e famílias, além de garantir que as práticas escolares não se limitem ao discurso, mas se traduzam em experiências reais de acolhimento e aprendizagem.

Mariane Meire Maciel Nunes de Lucena, coordenadora de Gestão Pedagógica, reforça essa perspectiva: “Esse envolvimento pode contribuir de diversas maneiras, garantindo acolhimento e necessidades do estudante. O compartilhamento de informações essenciais ajuda a estruturar rotinas e oferece um apoio significativo. É um direcionamento assertivo para que o estudante seja compreendido e respeitado.” Ela lembra que estratégias já implementadas fazem diferença no dia a dia: “Investimos em formação continuada sobre educação especial, inclusão e metodologias adaptadas. Essas práticas fizeram diferença real no aprendizado e no bem-estar de alunos autistas.”

Apesar dos avanços, os obstáculos permanecem. “Muitas vezes, a escola ainda se limita à integração, sem chegar à verdadeira inclusão. Há formações mínimas, sem preparo suficiente do docente, e ausência de uma rede de apoio estruturada. Isso fragmenta o acompanhamento e prejudica o desenvolvimento integral do estudante”, ressalta.

Mesmo diante das barreiras, experiências bem-sucedidas mostram que é possível avançar. Entre as boas práticas, destacam-se:

  • formação continuada de educadores;
  • ambientes sensoriais adaptados;
  • rodas de conversa sobre neurodiversidade;
  • flexibilização curricular;
  • projetos que envolvam toda a comunidade escolar.

Para a professora Mariana, a parceria entre escola e família é fundamental. “O aluno não é responsabilidade apenas da professora titular. O grupo de educadores deve se unir em favor dessas crianças, porque elas pertencem a todos que fazem parte do ambiente escolar.”

Ela acrescenta que além disso, seria fundamental que todas as unidades escolares desenvolvessem projetos, propostas e vivências voltadas para combater o preconceito: “garantindo assim que não haja qualquer forma de exclusão em relação a essas crianças. Elas precisam, acima de tudo, de muito amor e carinho”, ressalta.

Promover a inclusão é também investir no futuro. Quando a criança ou adolescente autista recebe apoio desde cedo, amplia suas possibilidades de autonomia, fortalece vínculos sociais e participa de forma ativa da vida em comunidade. É um movimento que transforma não apenas o estudante, mas toda a dinâmica escolar.

A Fundação leva esse compromisso para dentro das escolas por meio de formações que têm a educação inclusiva como tema. O objetivo é oferecer subsídios para que professores e gestores desenvolvam estratégias pedagógicas mais acolhedoras e eficazes. Assim, cada estudante tem a chance de avançar no aprendizado, fortalecer vínculos e participar ativamente da vida em comunidade, construindo um futuro mais justo e diverso para todos.