Notícias

Qual a importância dos primeiros mil dias do bebê?

Vie, 27/09/2024 - 10:09
Qual a importância dos primeiros mil dias do bebê?

A Fundação Abrinq acaba de implementar o Programa 1000 Dias, uma iniciativa que busca garantir o desenvolvimento pleno de um bebê desde o início da gestação até que o mesmo complete dois anos. E para explicar mais detalhes sobre a importância do período, a Fundação Abrinq conversou com a pediatra Beatriz Adriane Gonçalves.

Entrevista com a Dra. Beatriz Adriane Gonçalves

Por que os primeiros mil dias de vida são considerados tão críticos para o desenvolvimento de um bebê?

Os primeiros mil dias são um período de enorme potencial e imensa vulnerabilidade. A forma como as mães e as crianças são cuidadas durante este período tem um impacto profundo na capacidade da criança de crescer, aprender e prosperar. 

Este período representa a janela de oportunidades para a realização de intervenções que podem beneficiar a saúde daquele indivíduo na infância e na vida adulta, além das futuras gerações. 

Questões relacionadas ao ambiente e aos eventos ocorridos nas fases iniciais da vida têm efeitos de longo prazo e com transmissão transgeracional, impactando a saúde e aumentando a vulnerabilidade ao surgimento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) — como obesidade, hipertensão, diabetes, câncer, doenças alérgicas e reumatológicas — além de alterações psiquiátricas (como depressão, ansiedade e esquizofrenia) e do neurodesenvolvimento (como autismo, TDAH e atrasos no desenvolvimento).

Como a nutrição da mãe durante a gestação impacta o desenvolvimento do bebê?

Hipócrates disse: “nós somos o que comemos”, mas, à luz do conhecimento atual, podemos dizer que “nós somos o que nossas mães comeram”. A deficiência de micronutrientes como ferro, ácido fólico, zinco, vitamina B12 e ômega 3 pode piorar os desfechos tanto da gravidez e do parto (depressão materna, diabetes gestacional, pré-eclâmpsia, prematuridade, baixo peso ao nascer) quanto do desenvolvimento da criança (alterações no crescimento, desenvolvimento e imunidade), além de reduzir os níveis desses nutrientes no bebê. A ingestão de alimentos saudáveis e variados pela gestante interfere na aceitação desses alimentos pelo bebê nos primeiros anos de vida. Ademais, tanto a desnutrição quanto a obesidade, ou ganho de peso acelerado durante a gestação, interferem negativamente na saúde da mãe (aumento do risco de pré-eclâmpsia e diabetes gestacional) e do bebê (aumento da incidência de DCNT na prole).

Quais os principais cuidados que os pais devem ter durante os primeiros meses de vida?

•    Priorizar o parto normal, exceto em casos em que a cesárea seja realmente necessária.
•    Promover o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses e continuado até os 2 anos ou mais.
•    Oferecer alimentação complementar variada e saudável após os 6 meses de idade, evitando alimentos ultraprocessados e açúcar.
•    Garantir a vacinação contra todas as doenças imunopreveníveis (as que podem ser prevenidas por vacina) possíveis.
•    Estimular adequadamente o desenvolvimento neuropsicomotor, com intervenção precoce quando necessário.
•    Evitar o uso de telas (TV, tablet, celular) até os 2 anos de vida.
•    Proporcionar um ambiente emocional estável, amoroso e livre de eventos estressores ou traumáticos.

Como os pais podem promover o desenvolvimento cognitivo e emocional do bebê nesse período?

•    Estimular o desenvolvimento motor, de linguagem e sensorial com intervenções adequadas a cada idade (disponíveis, por exemplo, na caderneta de vacinação).
•    Proporcionar um ambiente estável e amoroso para que a criança se sinta segura e protegida, onde possa aprender a se relacionar com o outro de forma saudável.
•    Evitar expor a criança a adversidades ou experiências negativas de forma intensa, frequente e/ou prolongada, que exceda sua capacidade autorregulatória (habilidade de modular a própria emoção, cognição e comportamento para atingir um objetivo e/ou se adaptar às demandas cognitivas e sociais em situações específicas).

Quais são os sinais de que o desenvolvimento do bebê pode estar comprometido nos primeiros mil dias?

•    Crianças que não alcançam os marcos de desenvolvimento esperados para sua faixa etária. Esses marcos devem ser avaliados em todas as consultas de seguimento da criança e estão disponíveis em várias fontes, como o CDC americano, a Sociedade Brasileira de Neuropediatria e a Caderneta de Saúde da Criança, do Ministério da Saúde.
•    Crianças que perdem habilidades que já haviam adquirido previamente.
•    Crianças que apresentam interação social pobre ou ausente, baixo contato visual, alteração persistente de humor e baixa resposta a estímulos.
•    Crianças com diferenças acentuadas na força ou nos movimentos entre os lados do corpo, assim como crianças muito rígidas (hipertônicas) ou muito molinhas (hipotônicas).

Qual a importância do acompanhamento pediátrico regular nos primeiros mil dias?

A puericultura é o acompanhamento de rotina realizado por profissionais de saúde, que visa proteger o paciente contra quaisquer agravos que possam interferir em seu pleno desenvolvimento.

Muitos pais acham que a consulta de rotina serve apenas para pesar e medir a criança e, por isso, acabam não levando-a, pois "ela está bem".

Primeiramente, os dados de peso e altura são importantes para diagnosticar precocemente diversos problemas de saúde, cujas primeiras alterações podem se manifestar no crescimento da criança. Além disso, o exame clínico permite o diagnóstico precoce de doenças que podem ter sua evolução modificada com o tratamento adequado.

Além das medidas e da avaliação clínica, a consulta de rotina deve englobar muitos outros aspectos que influenciam a saúde e o desenvolvimento da criança (e do futuro adulto), como amamentação, alimentação saudável, suplementação de ferro e vitaminas, avaliação e orientação sobre o desenvolvimento neuropsicomotor, sono e vacinação.

Muito pode ser feito para melhorar os desfechos de saúde quando as consultas de rotina são realizadas adequadamente! O ditado "prevenir é melhor que remediar" também se aplica à saúde das crianças.

Etiquetas